MotoGP, 2020: A influência da falta de público

Por a 1 Novembro 2020 13:00

Será que podemos argumentar que a ausência de público nos circuitos tenho tido influência no aparecimento de muitos vencedores este ano?

Muito se tem falado da singularidade desta época de Moto GP, em que, a três corridas do fim, oito pilotos já venceram, e com 75 pontos em jogo, uma quantidade incrível recuando até Zarco em 14º, podem ainda matematicamente ser campeões.

A razão mais óbvia desta situação, frequentemente apontada, é a ausência do multi-campeão Marc Márquez.

Outra razão que se poderia adiantar como hipótese é estarem muitos “ex-rookies” rápidos, no seu segundo ano na classe, (e a montar uma variedade de marcas desde as tradicionais vencedoras como a Yamaha ou a Ducati às novas e inesperadas como a KTM) de repente a revelarem-se como um caso sério na categoria.

Estão neste caso Pecco Bagnaia, Miguel Oliveira, Fabio Quartararo, ou até Mir, que atualmente lidera o campeonato sem nunca ter vencido uma corrida de MotoGP.

Porém, deixem-nos sugerir uma terceira hipótese que poderá ter peso e da qual, que saibamos, ninguém ainda falou: a necessidade ao longo da época de limitar a presença de espetadores, que fez com que os pilotos tivessem de correr em circuitos vazios, com o silêncio quase sinistro de bancadas vazias única testemunha dos seus esforços.

É sabido como, numa peça de teatro, os atores interagem com o público, e a presença deste permite a um ator experiente, segundo as diminutas reações de surpresa, de riso ou de aplauso da audiência, mudar subtilmente o ritmo de uma peça, tornando cada representação única, razão porque muitos atores preferem o teatro ao cinema, ou dizem ser este a sua primeira paixão.

Poderemos argumentar que a ausência deste feedback das pistas em 2020 está também a ter uma influência na motivação, e logo, no comportamento dos pilotos?

É fácil de ver que a presença do público, especialmente das bancadas de apoio individual, com curvas inteiras, por exemplo em Jerez, Assen, ou Barcelona, dadas ao amarelo VR46 de Valentino Rossi, ao laranja Repsol de Márquez, ou ao vermelho da Ducati, terá uma influência forte na motivação dos pilotos.

Até a presença dum braçado de fãs com bandeiras portuguesas em dados circuitos deve muitas vezes ter enchido o coração de Miguel Oliveira, ele que nunca pôde ainda correr num Grande Prémio de casa na classe rainha, e vai fazê-lo pela primeira vez agora em Portimão.

Concorrentes que normalmente chegam nos lugares do meio do pelotão, de repente saltam para os lugares da frente, outros que sabem estar a correr sobre o escrutínio direto do seu público, dos seus fãs, fazem um esforço extra para estar à altura da ocasião, e daí ganham motivação e confiança adicionais, muitas vezes para obter resultados extraordinários.

Não é por nada que, frequentemente, a primeira vitória de um piloto num Grande Prémio ocorre no seu circuito de casa, onde todos esses factores se conjugam para tornar o piloto invencível no dia.

Este ano, pelo contrário, a coisa tem sido muito diferente. Não só pilotos e equipas tiveram que jogar em estádios desolados, despidos do calor da presença do público nas bancadas, mas os vencedores tiveram que se habituar a fazê-lo perante uma pequeníssima entourage de meia dúzia de elementos da sua própria equipa e equipas rivais.

Pelo contrário, a necessidade tornou-se, com muitas provas sequenciais dois encontros consecutivos no mesmo traçado, de se concentrarem na interação com a equipa, para converter o mar de dados recolhidos na primeira corrida em hipóteses de afinação úteis para melhorar a moto na corrida do fim-de-semana seguinte.

Esses dados, com sensores montados na moto para medir tudo, formam um vasto manancial, desde comportamento do motor, regimes, zonas de aceleração, mapas de injecção, consumo de combustível, à atuação dos vários controlos de tração,  afundamento da suspensão, temperatura e desgaste dos pneus, inclinação em curva, tempos ideais de aceleração, até a mudança no comportamento da moto à medida que o combustível desaparece do depósito e a relação de peso entre a dianteira e traseira se alteram.

Tudo fica registado para escrutínio posterior e a sua aplicação e conjugação desses dados entre si, abre um vasto leque de possibilidades às equipas, com aplicação imediata logo a seguir, o que não é normal no campeonato.

Num ano normal, apesar de muitos desses dados serem genéricos e sempre úteis para alvitrar hipóteses, outros são tão específicos ao traçado, que só voltariam a ser úteis um ano depois na mesma pista, e ainda assim se estivessem reunidas as condições meteorológicas e barométricas idênticas.

Terá isto ajudado rookies como Binder a amadurecer mais depressa, e favorecido pilotos mais analíticos, ajudando-os a andar à frente? Ainda há pouco, Morbidelli atribuiu a sua vitória a “entender melhor a moto”.

Terá isto acelerado a maturação de pilotos com limitada experiência, permitindo a nomes como Binder, Quartararo, ou Morbidelli, perceber melhor as suas motos e portanto, sentir-se mais confiantes nelas até ao fim de uma prova?

 Seja como for, a ausência do público, agora confirmada também, tristemente, para o “nosso” Grande Prémio de Portugal em Portimão, trouxe a este jogo um novo dado que nunca antes tinha sido lançado…

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